quinta-feira, 23 de outubro de 2008

Contradições...




Eu sou feliz demais, assim de graça, por natureza, mesmo quando as coisas não estão tão coloridas... Não, não sou Poliana, nem Teletubbie. Só me respeito. Exercito meu poder de opção. O mundo é o mundo, como é, talvez não como se queira, mas eu posso ser o que quero, escolher o que quero em minha vida.
Fiquei em silêncio esses dias, o que não é tão anormal assim,( aliás, é quase uma praxe), por conta dos acontecimentos de semana passada pra cá.
Não, não são acontecimentos internos, eles estiveram e estão em todos os noticiários. De vez em quando emerjo do meu reino profundo pra respirar, coloco a cabeça pra fora e ouço os sons do mundo exterior. Não, eu não sou uma alienada, se bem que, quem quiser achar que ache, eu sou o que sou e estou muito feliz com isso...
Eis que os sons exteriores andam numa desarmonia que parece ter três orquestras distintas tocando melodias descompassadas e igualmente distintas. É a dissonância total! Eu tenho ouvidos sensíveis, sabe? São decibéis cinzas demais, funestos demais para tímpanos tão delicados e ávidos por furtacores, por iridescências...
Meu compromisso com a felicidade não me permite introjetar esses sons. É de um agudo contundente demais saber das atrocidades humanas. Eu ainda prefiro colocar minha atenção nas coisas leves, na beleza que existe, no divertido, no lírico, nas palhetas aquareladas do idealismo, da ética, da espontaneidade e da essência divina do humano.
Eu ouço os sons dos becos, das encruzilhadas, mas não me envolvo com eles, não vasculho os escombros dos detalhes, não fico no "e se" daquilo que não tem volta. Não, pq isso é uma opção. Não vou intoxicar minha alma com isso, não vou contaminar minha visão e me sujeitar a ver o feio onde o feio não existe, ser uma caçadora da maldade. Não, eu não.
Sinto pelas famílias roubadas pela violência, roubadas no que lhes é mais precioso, seus entes queridos. É mesmo triste. É muito triste mas não me pertence.
Não me pertence um mundo de barbáries, pq eu tenho em mim um coração cheio de amor e é nisso que eu acredito. É ao que eu acredito que vou dar forças, pois tudo onde se põe atenção cresce. Por que não deixar florescerem os bons sentimentos? Os bons pensamentos, as boas obras, as boas ações?
É nisso que tenho me empenhado...
Dia desses eu até ri, tamanho meu treino, tem dado certo o ignorar. Meu contentamento era tanto que pela primeira vez ignorei a desagradável música alta que tocava na obra aqui em frente. Minha mãe é que me chamou atenção com uma frase: "Que horror de música!" Foi então é que notei que nem tinha percebido. Vi que funcionou meu treino. Que alegria! Pq, "levante a mão quem sabe fazer amor", afe! Que levante o que quiser, mas, com discrição, lá no seu canto, não pra eu ouvir... Não sou obrigada a ceder aos apelos erótico-auditivos alheios, os meus são mais refinados...(Mas isso é outro assunto.)
Sim, eu prefiro olhar pro outro lado, pra o que pode ser feito para que essa realidade se transforme numa mais harmônica, digerível e antes disso, saboreável com prazer.
Não, o passado não me interessa, talvez a parte boa, convertida em lembranças, essa sim. Mas meu tempo é o hoje. O que já foi já foi. O que podemos fazer para que venha o que merecemos ver? O que já estão fazendo? Em que posso ajudar? É nisso que penso, é com isso que quero me impregnar. É por isso que fui professora, é isso o que busco na nova carreira. Acredito sim em fazer a diferença, ainda que para poucos, qualquer diferença me basta.
O que não basta é ficar no desânimo. Eu sei que é uma prática diária, uma conquista diária dizer não a ele diante de todas as situações que estão aí. E que eu vejo sim, só me recuso a me aprofundar nelas.
Pra falar a verdade, não há quem não desanime, nem que por alguns minutos ou horas, por conta da avalanche de desgraceira, especialmente a da última semana... E, nesse sentido, uma das coisas que mais sinto falta é da propagação das boas notícias.
Eu sei que elas existem, mas, a mídia insiste em fazer sensacionalismo em cima das desgraças, vende mais, rende mais e não é nem preciso procurar muito. Em tempos de individualismo desmedido, falta de respeito humano e desigaldade social gritante, fica fácil. E fica até mais palatável a povos criados dentro da cultura judaico-cristã, onde a idéia de ser feliz soa quase como um pecado mortal.
A questão é que, a vida segue para quem não morreu, ou, para quem não se deixa morrer em vida. Então, o desânimo pode se caracterizar até como um ato de rebeldia, quando bem dosado. Um ato de auto-preservação também. Já quando vira rotina, quando perdura demais, soa a estagnação e a pessoa cai no esquecimento também, pq não há coisa que o ser humano suporte menos do que o silêncio. Esse medo de estar só consigo mesmo... Pq há como camuflar-se de si nos barulhos mundanos, mas não há como fugir de si quando só o silêncio paira no ar. Sou dada a silêncios e sei bem disso. O silêncio é o componente mais poderoso da impopularidade. (Salvo Chaplin.)
Como não sou algo em tempo integral, um adjetivo só em absoluto, e antes de mais nada, contraditória como todo ser humano, sou do tipo ruidosa, e seja o ruído coerente ou não, bom ou não, há um séquito quando há alarido e, quando muito uma companhia quando sou silêncio... Sim, as pessoas querem ouvir, não a si, mas ao mundo. Aliás, nem ao mundo. As pessoas não ouvem ninguém, na real acepção da palavra, elas escutam. Escutam ruídos e os traduzem segundo a sua melodia interna, aquela construída a partir de suas vivências, vitórias e dissabores... No fim, ninguém ouve ninguém, (são poucos os lúcidos) só à sua própria música incidental através do instrumento alheio.
Se é pra ser assim, já escolhi o meu, e ele tem todas as cores, com destaque para as com menos tons de cinza e preto.
Eu que reclamava, descobri que não era sina, era bênção. Abençoado ascendente em Peixes!




P.S.: Eu sei que baleia NÃO é peixe!
Falando nelas, quem quiser vê-las é só clicar.

3 comentários:

De Marchi ॐ disse...

"ninguém ouve ninguém, só à sua própria música incidental através do instrumento alheio."
Excelente frase... :)

A Moça disse...

Gosto muito do pedaço de uma música que diz: " A vida tem sons que pra gente ouvir, tem que aprender a começar de novo..."
Um beijo, querida!

웃 Mony 웃 disse...

Enfim, hoje vi que não sou tão maluca assim, que meu entendimento não deve ser de todo equivocado...
Olha só o trecho de um livro que encontrei:

"(...) meu pensamento profundo do dia: é a primeira vez que encontro alguém que procura as pessoas e que vê além. Isso pode parecer trivial, mas acho, mesmo assim, que é profundo. Nunca vemos além de nossas certezas e, mais grave ainda, renunciamos ao encontro, apenas encontramos a nós mesmos sem nos reconhecer nesses espelhos permanentes. Se nos déssemos conta, se tomássemos consciência do fato de que sempre olhamos apenas para nós mesmos no outro, que estamos sozinhos no deserto, enlouqueceríamos. Quando minha mãe oferece petisfours da casa Ladurée à sra. de Broglie, conta a si mesmaa história de sua vida e apenas mordisca seu próprio sabor; quando papai toma o café e lê o jornal, contempla-se num espelho do gênero manual de autoconvencimento ; quando Colombe fala das aulas de Marian, deblatera sobre seu próprio reflexo, e quando as pessoas passam diante do concierge, só vêem o vazio porque ali não se reconhecem.
Do meu lado suplico meu destino que me conceda a chance de ver além de mim mesma e encontrar alguém."

trecho extraído do livro: "A elegância do ouriço" de Barbery.

Fala exatamente da idéia que Denis ressaltou em seu comentário. ;)